quarta-feira, 27 de abril de 2011


Se eu poetizo, deixa de ser real, passa do real ao imaginado, fica sendo apenas mais uma história e morre ali, não vai além do que está escrito, morre nos olhos de quem lê. 

Quando escrevo, o sofrimento vai se dissipando, deixa de pertencer a mim, passa a ser de um eu imaginado, terceirizado, lido e admirado, admirado não pela resiliência, mas pela capacidade surreal, ilógica e portanto fictícia de... de sofrer? Bem, vira sofrimento alheio, sofrimento abstrato, sofrimento impalpável, sofrimento dado de presente para quem junta essas letrinhas e forma palavras, frases e encontram algum sentido no que não tem sentido nenhum.
Não faz sentido. Não sei por quê escrevo isso. Talvez  esteja aí a lógica: um belo arranjo com as palavras torna doce o que é amargo... quando faço isso eu não preciso fazer sentido, eu apenas faço, me faço, eu apenas posso ser... ser sem ser eu, verdadeiramente eu.


Eu amo desorganizado, desavergonhado. Tenho um amor que não é fácil de compreender porque é confuso. Não controlo, não planejo, não guardo para o mês seguinte. A confusão é quase uma solidão adicional. Uma solidão emprestada. Sou daqueles que pedirá desculpa por algo que o outro nem chegou a entender, que mandará nova carta para redimir uma mágoa inventada, que estará se cobrando antes de dizer. Basta alguém me odiar que me solidarizo ao ódio. Quisera resistir mais. Mas eu faço comigo a minha pior vingança. Amar demais é o mesmo que não amar. A sobra é o mesmo que a falta. Desejava encontrar no mundo um amor igual ao meu. Se não suporto o meu próprio amor, como exigir isso? Um dia li uma frase de Hegel: “Nada de grande se faz sem paixão”. Mas nada de pequeno se faz sem amor. (…) Não me dou paz sequer um segundo. Medo imenso de perder as amizades, de apertar demais as palavras e estragar o suco, de ser violento com a respiração e virar asma. Até a minha insegurança é amor. 
Fabrício Carpinejar

terça-feira, 26 de abril de 2011

Zeca  Baleiro
Eu não quero ver você cuspindo ódio
Eu não quero ver você fumando ópio, pra sarar a dor
Eu não quero ver você chorar veneno
Não quero beber o teu café pequeno
Eu não quero isso seja lá o que isso for
Eu não quero aquele
Eu não quero aquilo
Peixe na boca do crocodilo
Braço da Vênus de Milo acenando tchau
Não quero medir a altura do tombo
Nem passar agosto esperando setembro, se bem me lembro
O melhor futuro: este hoje escuro
O maior desejo da boca é o beijo
Eu não quero ter o Tejo escorrendo das mãos
Quero a Guanabara, quero o Rio Nilo
Quero tudo ter, estrela, flor, estilo
Tua língua em meu mamilo água e sal
Nada tenho vez em quando tudo
Tudo quero mais ou menos quanto
Vida vida, noves fora, zero
Quero viver, quero ouvir, quero ver.

sábado, 23 de abril de 2011

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."
Fernando Pessoa



Que bom seria se não tivesse que existir esse tempo, intervalo entre tudo, entre ser feliz e nao ser feliz. Ter que atravessar a ponte antes de chegar do outro lado, isso é tão assustador, porque a gente nunca sabe o que vai acontecer no caminho... 
Enquanto percorria esse caminho pela ponte, tropecei em pessoas que me ensinaram a me atentar mais para o que vem antes do fim, antes do "outro lado". É o agora, é emergencial viver esse agora, entende? E como também ouvi pelo caminho: se as coisas nos reduzem simplesmente a nada, do nada simplesmente temos que partir. Porque a gente vive, e é preciso viver."

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Dizem que finjo ou minto

    Dizem que finjo ou minto Tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto Com a imaginação. Não uso o coração.
    Tudo o que sonho ou passo, O que me falha ou finda, É como que um terraço Sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
    Por isso escrevo em meio Do que não está ao pé, Livre do meu enleio, Sério do que não é, Sentir, sinta quem lê !
    Fernando Pessoa
     
     

Quem olha para fora, sonha. Quem olha para dentro desperta. - C. G. Jung

"A princípio era um meio de evitar meus cataclismos pessoais. Depois de um  tempo, no entanto, a curiosidade passou a ser um impulso irresistível por si mesma. Concentrei minha atenção nos questionamentos e parei de valorizar somente o físico. Como se confirmou muitas vezes desde então, minha curiosidade  me levou a lugares com os quais eu realmente não tinha condições emocionais de lidar; mas a mesma curiosidade, aliada ao lado racional da minha mente, gerava uma estrutura e um distanciamento suficiente para permitir que eu me controlasse, me desviasse, refletisse e seguisse em frente. E foi assim que deixei o lugar-comum algumas vezes e fui além. Ousando, enchendo o peito de coragem e o corpo de força."

Por Débora Leão
http://abeillesbeatles.blogspot.com/

domingo, 10 de abril de 2011

"Me fiz em mil pedaços
Pra você juntar
E queria sempre achar
Explicação pro que eu sentia.
Como um anjo caído
Fiz questão de esquecer
Que mentir pra si mesmo
É sempre a pior mentira,
Mas não sou mais
Tão criança a ponto de saber tudo.
Já não me preocupo se eu não sei por que.
Às vezes, o que eu vejo, quase ninguém vê
E eu sei que você sabe, quase sem querer
Que eu vejo o mesmo que você."
Mais um dia amanhecendo e ela ainda sentada naquele sofá, olhando para o mesmo nada, o nada que a acompanha em toda falta de sentido que tem sido a sua vida.
Tem vivido os últimos dias quase como uma tentativa de provar para seus "responsáveis" que consegue se manter viva, bem, que consegue ser responsável por si mesma.
Ela tem perdido a confiança de todos aos poucos...
Era um dia comum, ela sorriu o mesmo sorriso de sempre, e saiu... caminhou até seu quarto, mergulhou em seu mundo, se perdeu nos labirintos criados por ela própria e quando se deu conta já tinha feito tudo de novo.

Dorme...
Um sono inquieto, entrecortado por figuras oníricas que se misturam com os estímulos da realidade.

Falta de sentido, pensamento ilógico, sentimento vazio, tudo oq quis foi cessar a dor, sorrir o sorriso doce, sentir a vida, sentir... apenas sentir, na pele, a vida!

domingo, 3 de abril de 2011

Eu poderia falar sobre muitas coisas por meio dessa imagem. Eu até tenho muito a falar, mas, nesse momento, prefiro o silêncio, prefiro a contemplação, aquele tipo de contemplação assustada, meio pasma...
Nada que eu disser vai recobrir com fidelidade o que eu sinto, da mesma forma que esta imagem também não o recobre bem, e não ilustra suficientemente todas as histórias que carrego comigo e que poderia começar a contar agora.
Ninguém entenderia nada. Ainda pareço falar coisas sem sentido, sem nexo... e na verdade, talvez seja melhor assim. Ainda me angustia contemplar. Ainda me angustia pensar nesse turbilhão de emoções e confusões que entrecortam minha cabeça e meu coração...
É muito mais que a "Persona" de Bergman, é muito mais que qualquer fotografia, filme, teoria podem explicar... Talvez uma minoria muito restrita entenda do que eu estou falando, talvez quem assistiu ao filme possa fazer uma ideia, talvez minha psicanalista compreenda melhor, mas de forma bem limitada.
Quem mais pode dizer alguma coisa sobre isso a não ser eu mesma, e quem, dentro de mim, sabe dizer? Qual parte de mim diria melhor? Identificação, duplo... blablabla... Não se trata de amor? Um amor estranho, indefinível, meio transferencial, meio pathos, até meio narcísico... mas um amor, não? Não, é mais forte que isso, mais doente, mais inexplicável, mais incontrolável, mais louco, muito louco...