quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Foto: Lissy Elle


Eu sinto que tem uma escrita aqui dentro que quer sair, mas ainda não sei que forma dar a ela! 
Eu podia reclamar do calor que invade o meu quarto pela janela, em forma de filetes de luz do sol. Esse calor que derrete célula por célula da minha paciência e me prostra assim, nesse chão mais fresco, nua, submissa, humildemente buscando por um mínimo de conforto! 
E daqui de baixo, do chão, escrevo isso que ainda não tem contorno, esse esboço, isso que nem sei do quê se trata. 
Então me escapa um choro angustiado, enraivecido, sem razão, só porque, de repente, fico in-su-por-tá-vel pra mim mesma! Sinto forte uma impaciência, uma irritação, que aceleram meu coração, me fazem tremer e brigar com quem se aproximar e tentar alguma conversa. É tão irracional essa mudança repentina de humor que nem parece repentina. Mais parece crônica, um ódio do mundo e de mim mesma crônico que às vezes me expõe, quebrando o meu segredo. Raiva, um tédio e uma insatisfação que, outras pessoas talvez chamariam de... vazio. 
Torna-se impossível existir por esses momentos, passo a ser insustentável para mim mesma, primeiramente, e depois, para quem estiver por perto. Mas passa, e pra fazer passar nem sempre o choro basta. É preciso me debater contra esse chão, contorcer esse corpo semi-nu na cerâmica fria até a angústia sair pelo suor da pele,   esmurrar a parede, talvez gritar, escrever... É preciso ficar só. "Que todos sumam, que todos sumam!" - Eu repito comigo mesma várias vezes.  Passa, alguma hora, de alguma forma, está passando agora...
É que de repente você não consegue mais conceber seu corpo, e ele te parece grande e desproporcional demais, desajeitado demais, incômodo demais, como se você tivesse acabado de ganhá-lo, acabado de ser colocada, ou presa, dentro dele. Então você precisa aprender a se movimentar e a se virar com esse corpo que você não reconhece, que parece que nunca foi seu! 
Fica insuportável tentar suportar! Falta não só a consistência de um "eu" corporal mas também de um "eu" interno, constituído de referências e propósitos. É como se, o que eu faço e o que eu sou não existissem, fossem uma mentira, não fizessem nenhum sentido, porque minhas referências se dissolveram. Agora, é como se tudo o que eu tenho não fosse meu, não viesse de mim. Não sou, e mesmo assim, tento sobreviver, suportar. 
A gente vai juntando mágoas que crescem como bola de neve. O perigo é que a bola de neve guarda em seu meio alguma coisa inflamável, é possível suportar, até o momento que essa coisa explode.
Tem hora que a fúria, ou seja lá o que for que eu sinto, explode também e queima tudo em volta. Não posso controlar, arde, queima aqui dentro!  E olha só que irônico: um monte de pessoas que me ajudaram a construir essa bomba, mas que me deixaram pelo caminho, não assistem ao resultado, perdem o melhor da festa: o "Boooom!!!"... o fogo, a chama, a dor, o sofrimento.
Tudo o que eu mais queria era paz, mas essa agitação dentro de mim não dorme nem quando eu durmo, e então eu volto a sonhar aqueles sonhos de guerra, a minha guerra. 
Essa agitação dentro de mim persiste, e me exaure! Quando penso que estou forte, tropeço nos meus próprios pés e vejo que ainda nem aprendi a andar! Em todos os sentidos, sinto-me cheia ou vazia, mas nunca satisfeita...

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012



Eu odeio estar na metade das coisas. Ser quase isso ou aquilo. Estar a um passo de. Ter que esperar. Odeio a espera, o processo, a lentidão do caminhar antes de conseguir chegar ao que se objetiva. Eu quero tudo pra já, pra ontem, e que seja do meu jeito, tem que sair perfeito! Aprender exige muita paciência e eu tenho pressa! Não tenho preguiça, não faço corpo mole, eu quero aprender, mas já, agora, tudo o quanto for possível. Não dou espaço pro cansaço e a frustração é combustível pra eu tentar de novo, e de novo, e de novo... até sair do jeito certo! Jogando as regras do meu próprio jogo, dominei meu pensamento obsessivo, autocrítico e sistemático, e fiz dele meu aliado. Não mais me escraviza, mas me disciplina, me educa, garimpa e lapida talento, vai ter brilho na pedra envolta por barro! Mas não aguento mais esperar a chuva lavar o barro que me cega para o brilho da pedra. Há pressa dentro de mim, há fome demais dentro de mim, fome demais de aprender, aprender logo e ter um nome diferente, um significado diferente, um significado apenas.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Quarta-feira de cinzas...



"Custei a compreender que fantasia
É um troço que o cara tira no carnaval
E usa nos outros dias por toda a vida..."


Fantasia - Aldir Blanc e João Bosco





Foto: Frederica Erra.

O colorido do carnaval...

Tom Zé - Sonho colorido de pintor.

Sonhei que pintei minhas noites de amarelo
lindas estrelas no meu céu eu coloquei
o feio que era feio ficou belo
até o vento do meu mundo eu perfumei.

Numa apoteose de poesia
num conjunto de harmonia
uma lua roxa para iluminar
as águas cor-de-rosa do meu mar.

Meu sol eu pintei de verde
que serve pra enxugar lágrimas
se um dia precisar.
A dor e a tristeza
fiz virar felicidade
aproveitei a tinta
e pintei sinceridade.

Pintei de azul o presente
de branco pintei o futuro
o meu mundo só tem primavera
o amor eu pintei cinza escuro.

Pra lá eu levei a bondade
dourada é sua cor
aboli a falsidade
o meu povo é incolor.

Na entrada do meu mundo
tem um letreiro de luz
meu mundo não é uma esfera
tem o formato de cruz. 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

                                                                                                      Foto: Lissy Elle
O tempo inteiro fico irritada por me deparar o quanto o passado não consegue ficar quieto no seu espaço de tempo e fica invadindo o presente pelas rachaduras, pelas fendas que não ficaram muito bem tapadas quando me incumbi de não deixar nenhuma brecha pra que nada, ninguém e nenhuma lembrança voltasse. 
As pessoas que não existem mais voltam feito fantasmas, ficam rondando e invadindo meus sonhos à noite. Fazem barulhos assustadores e insuportáveis, e não, não são vultos, as imagens são nítidas demais, táteis demais, audíveis demais... 
O tempo não tem feito seu trabalho com excelência, tudo passa na minha cabeça como se tivesse ocorrido ontem, e não foi. 
Quero matar as pessoas e as lembranças outras e tantas outras vezes quantas forem necessárias, não me importo, embora saiba que vão voltar... e eu sei porque voltam, eu sei porque esses fantasmas do meu passado estão votando: eu os chamo. 
Eu os chamo porque não disse tudo lá atrás, porque ainda tem muita coisa que quero dizer a  eles, verdades minhas que deveriam ter sido ditas e que hoje arranham a minha garganta, me sufocam... 
Eu sei, eu não preciso falar tudo. Sempre vai ter uma ou outra coisa que ficou por ser dita. Eu só vou me aquietar e deixar o passado ir, não quando eu falar, mas quando eu verdadeiramente souber que não é preciso dizer tudo, que é preciso deixar as pessoas irem sem entenderem metade do que se passou, metade do que se sentiu.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A Ruiva - Toulouse Lautrec

O que não sei fazer desmancho em frases
Eu fiz o nada aparecer
(Represente que o homem é um poço escuro
Aqui de cima não se vê nada
Mas quando se chega ao fundo do poço já se pode ver
o nada)
Perder o nada é um empobrecimento. 


Manoel de Barros
Livro Sobre o Nada

sábado, 4 de fevereiro de 2012



Me cansei de lero-lero
Dá licença, mas eu vou sair do sério
Quero mais saúde
Me cansei de escutar opiniões
De como ter um mundo melhor
Mas ninguém sai de cima, nesse chove-não-molha
Eu sei que agora eu vou é cuidar mais de mim
Como vai? Tudo bem
Apesar, contudo, todavia, mas, porém
As águas vão rolar, não vou chorar
Se por acaso morrer do coração
É sinal que amei demais
Mas enquanto estou viva e cheia de graça
Talvez ainda faça um monte de gente feliz...

Saúde
Rita Lee