quinta-feira, 30 de agosto de 2012

                                                                      Foto: Lissy Elle
Caminha pela casa sem um rumo certo, vai até à geladeira, mastiga alguma coisa cujo gosto nem faz muita questão de sentir. Repete isso algumas vezes. Solta algumas frases feitas, de efeito. Balbucia qualquer coisa consigo mesma, nem mesmo ela é capaz de entender.
Ela não chorou em nenhuma das vezes que sentiu vontade de chorar. Alguma lágrima desceu sim pelo seu rosto, serpenteando-o. Eu pude ver a lágrima secando na pele, ou caindo no canto da boca, antes que pudesse chegar ao seu fim. 
Queria algo que justificasse essa lágrima estúpida, essa existência medíocre. Sentia que precisava de mais, precisava de um canto em que pudesse bater com força a cabeça, encostar a cabeça e chorar, gritar, morder os lábios, esfregar os olhos... 
Ela não chorou, e então seu coração se encheu como as chuvas de verão enchem os rios, ficou prestes a transbordar. Mas manteve-se morna, densa, seca, como fica o ar naqueles dias em que não há vento. Eu gosto quando venta.
Ela deve ter algum plano em mente. Deve estar testando o alcance de suas emoções. Deve estar calculando o quanto de dor cabe em si antes que transborde e alague, com sua dor líquida e sem forma, tudo em volta.
Ouvi ela dizer, entre um soluço e outro, que parecia bicho de outra espécie. Que se sentia semente que não germinou direito e que cuspia nas flores porque elas pareciam sempre felizes demais. Que atirava pedras nos pássaros por inveja, porque bastava que abrissem os braços para que voassem. Tinha a ilusão de que voar era como se desprender da vida. 
Ouvi ela dizer, entre um soluço e outro, que queria morrer nas entranhas de sua mãe. E que não lhe faltasse nada, não lhe falte nada. Os olhos vermelhos é choro, mãe. A porta aberta é convite, a porta fechada é recolhimento. Eu quero chorar no calor do teu seio, mãe. Eu quero que me tire daqui, desse mundo que me machuca como um fórceps machuca um bebê. A minha vontade de nunca ter saído de ti é do tamanho da força do teu ventre ao me empurrar pra fora. Aqui fora é frio, mãe. Nasci, e a consciência de estar viva me traz o medo da morte. Comecei a morrer desde então. Eu quero morrer nas suas entranhas, mãe. Os olhos vermelhos é choro e esse delírio é febre, mãe.
Ouvi ela dizer, até que a porta foi cerrada...

quinta-feira, 23 de agosto de 2012


Ontem eu ouvi de uma pessoa muito especial:
"Silêncio não é tristeza e paixão não é loucura."

Eu já não sinto vontade de falar. Já não quero falar mais nada e sei que isso é uma ânsia que me toma por dentro, para que eu transforme o impulso da palavra em ação. 
Mas o corpo não responde da mesma forma que a língua, o corpo também não responde. 
Não dói tanto ficar em silêncio quanto me dói a inércia. 
A compulsão pelo dizer tomou outra forma, ela me empurra em direção a uma busca quase insaciável. 
Buscar é sim uma palavra interessante, que define não só um momento da vida, mas todo um percurso de vida. Agora eu busco paixão. Busco algo perdido ou que ainda não conheci, mas que me movimente, inspire, me faça perder a razão e parecer louca. 
Eu quero a paixão, não por uma outra pessoa, mas por coisas com texturas diferentes, uma causa, um tema, um trabalho... há tanto amor espalhado por aí, colocado em cada coisa que existe... eu quero captar, absorver, sentir esse amor. 
Há tanto amor desperdiçado também... jogado ao vento, ao tempo, à indiferença...
Eu posso estar buscando muito longe o que vou encontrar debaixo do meu nariz, sob a minha pele, bem aqui dentro de mim. A paixão deve ser buscada aqui dentro, aqui mesmo onde também moram meus monstros, meus medos, tudo aquilo que me barra, me faz recuar. Há muito amor competindo espaço com meus monstros.

Se um dia essa tal pessoa especial, por um acaso esbarrasse nesse post, saberia que me toca com o que diz. Não é fácil encontrar pérolas em meio a tantas pedras brutas. 
Com certeza essa pessoa acharia esse monte de palavras exagerado, desmedido... e eu ficaria envergonhada, mas daria aquela mesma explicação que um dia essa pessoa escreveu em uma carta: "Tudo se resume em uma só palavra: Sensibilidade."

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Foto: Brooke Shaden                              

Não se espantem com o tema escolhido essa noite... não se espantem se, assim como eu, também não conseguirem responder muito bem ao "o que é ser mulher?" 
É realmente difícil ser mulher se a definição para isso está embasada, na sua maioria, em conceitos machistas. Ser mulher é ser frágil? É chorar nos fins de relacionamentos e em casamentos? É fazer drama e charminho pra conseguir o que quer? 
Se ser mulher depende de que eu abdique de posicionamentos firmes e posturas maduras, então nasci num corpo errado.
O feminino não tem segredos, tem mistérios. 
O feminino não se submete a explicações que não sejam metáforas.  
A alma feminina é dúbia. Mulher é como um rio, explico:  
A feminilidade é facilmente associada à passividade... o frágil, aquilo que recebe, o corpo anatomicamente desenhado para receber o falo, acolher. 
Por outro lado, esse corpo se mostra ativo no momento em que é ele que, como uma boca úmida, faminta e insaciável, engole o falo e ameaça a sua perda para sempre, despertando no masculino o terror da castração.
Pode-se dizer o mesmo das águas de um rio, passivas, que correm sem poder parar ou mudar de rumo. Mas arrastam com voracidade o que quer que caia nelas. Águas que pesam, pressionam, arrastam, envolvem, tragam... que não revelam o que circunda a margem. Perigo, perigo. Risco.
São fortes, são bravas.

terça-feira, 14 de agosto de 2012


Foto: Brooke Shaden

Eu pareço bem, eu sei. Eu até chego a me convencer disso!
Momentos como este, em que estou sozinha, me lançam cara a cara com aquela parte de mim que não descansa.
Por mais que eu tente me defender, uma hora ou outra, no escuro do quarto, no isolamento do banheiro, no reflexo do espelho, eu vou lembrar que ainda carrego em mim aquela parte adoecida...
Eu vou sofrer por aqueles velhos motivos, eu vou chorar de cansaço, frustração ou simplesmente tristeza.
Eu vou chorar quando ninguém estiver por perto, quando mais ninguém puder ver, porque, na verdade, eu acho que nunca estive bem, totalmente bem...
Quando eu parecer bem, não vou estar por inteira.