domingo, 3 de junho de 2012


 
Na minha trajetória acadêmica eu sempre estive muito próxima à área da saúde mental. Nesse campo, a gente aprende que não importa se o conteúdo do delírio é realmente verdade ou não e que, o que caracteriza o delírio é o estatuto de verdade, irremovível, que o psicótico dá a ele. A gente deve ouvir o delírio, e não procurar pontos de verdade e de mentira nele.
  Nesse aspecto eu me dei bem, sempre gostei muito de ouvir histórias, sem me importar com o quanto de real ou fantasia elas continham. A nossa vida está cheia dessas histórias, cercada por pessoas que "deliram" o tempo todo e o pior, nos levam junto nas suas crenças sobre si mesmas. E nós? Quantas vezes contamos falsas histórias sobre nós mesmos, sobre o que somos, ou pensamos ser, sobre o que sentimos, fazemos...
  Contamos tantas vezes para o outro que chegamos mesmo a acreditar na nossa própria invenção, no nosso delírio. Auto-afirmação? 
  Nossa auto-imagem é tão frágil, fragmentada, que é preciso sim criar histórias, florear o que existe de minimamente verdadeiro para que se torne talvez um pouco mais interessante. É difícil ser interessante hoje em dia. 
  A verdade é só uma mentira muito bem contada, já dizia Monteiro Lobato na voz de sua personagem Emília. Da mesma janela se vê cem paisagens diferentes, e se narram mais outras cem, tudo é muito relativo. O que você enxerga de mim? Quem vai dizer que não é mesmo a verdade do que eu sou? A sua verdade incide sobre mim e a forma como você escolhe me ver ou eu escolho me apresentar para você é sim uma das cem paisagens da janela, uma das cem facetas do meu ser. 
  Vivemos uma psicose bastante perigosa, não? Afinal, ela se disfarça sob o olhar do outro, não se deixa às claras, engana, arrasta os que estão próximos. É tudo isso assim tão louco que chega a passar despercebido.

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